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Foto do escritorEliel Lima

Psicologia das massas e analise do Brasil: células nazifascistas na psique grupal e as escolas como


“A juventude é profundamente necessária para todas as mudanças culturais e nada muda se a juventude for sacrificada.” - Sonia Alberti




O tema do texto de hoje parece tanto espinhoso quanto extremamente problemático, mas para aqueles acostumados com a história do Brasil sabem que vira e mexe a barbárie se apresenta como alternativa da psique grupal (ou do corpo social) para manifestar seus sintomas. Em específico falaremos sobre escolas, adolescência, masculinidades e nazifascismo.


É sabido para aqueles letrados nos processos nazificantes da sociedade que o governo anterior possibilitou através dos seus atos e omissões uma maior versatilidade para que grupos extremistas tivessem a possibilidade de se organizar, pensando nisso o atual governo ainda na sua transição elaborou um documento “O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental” onde se verificou que de 2002 a 2022 foram registrados 16 ataques a escolas dos quais quatro no segundo semestre do ano passado, com 35 mortos e 72 feridos. O flerte com essa realidade histórica importada pode ter solo fertil desde a colonização, arrastando-se pela escravidão, encontrando entre os anos 40 - 80 (com larga observação nos documentarios “o menino 23” e “anauê”) lugares confortaveis de assentamento e agora com o fertilizante reacionario preparamos a terra para banhos de sangue bem equipados (somado ao acesso e articulação via internet).


Segundo a pesquisadora Adriana Dias, até o ano passado, a mesma conseguiu mapear mais de 500 grupos neonazistas atuantes no Brasil, somando cerca de 10.000 membros. São fóruns, salas de conversa, perfis, páginas e todo um volume de conteúdo cujo alcance atinge mais de meio milhão de pessoas, também pôde visualizar a relação íntima dos grupos com o antigo governo (relação essa encontrada desde 2004) seja através do apoio ou através de mensagens subliminares durante a governabilidade do então presidente Jair Messias Bolsonaro (os exemplos são inumeros como: ter posado para foto junto com sósia de Hitler; questionar a existencia do holocausto sendo chamado por alguns apoiadores de “holofraude”; simbolos neonazista amplamente divulgados nas manifestações pró governo; expressão utilizada por nazistas feito por um ministro do então governo; estreitamento da relação com neta do ministro das finanças atuante durante regime nazista; por diversas vezes Bolsonaro manifestou publicamente admiração por Hitler; Ministro de Bolsonaro reproduzindo pronunciamento feito por ministro nazista), enfim, caso necessario os leitores podem fazer uma lista em ordem alfabetica das situações que denotam o apreço do regime neofascistano antigo governo. Todos os comportamentos citados não são frutos de um posicionamento político contrário à governabilidade anterior em relação a atual, antes de tudo, me baseio nos textos de Adorno que pesquisou largamente o processo de propaganda fascista que desmembrarei mais adiante.


Ligarei dois pontos nesse momento que podem parecer destoar um pouco mas se convergem de tal forma que ara o terreno já mencionado: o adolescente e a masculinidade. Notadamente falo especificamente tanto de adolescentes quanto de masculinidades

inscritas sob o viés desestruturante (ou totalmente estrutural como veremos) de um tipo de virilidade e vulnerabilidade já amplamente comentado por mim em outros textos nesse mesmo canal de blog.

Um levantamento feito por pesquisadores da Unicamp e Unesp indicou que a maior parte dos atendados ocorreu por pessoas que estudavam ou já haviam estudado nas escolas atacadas, sendo a maioria adolescentes e jovens adultos, brancos e homens. Esse dado vai de encontro com as pesquisas feitas sobre as masculinidades contemporâneas, mas vamos começar pelo começo.


Colonialidade e eugenismo


Esse título pode causar um pouco de estranhamento num texto que se pleiteia dialogar com os massacres nas escolas, entretanto, os problemas sócio-históricos tem que ser tratados como tal e a contextualização é fundamental para esmiuçar (ou tentar) a estrutura que se pretende compreender, ao voltarmos para a história da colonialidade voltamos para a construção dos brasileiros e seus grupos.


No início eram os povos originários, eles povoavam o Brasil (que ainda não era Brasil), cuidavam das suas terras, tinham formas específicas de relações e subjetividades, sexualidades e identidades de gênero e tal como Fanon já disse “No primeiro olhar branco, ele sentiu o peso de sua melanina”. Ao atracar no nosso país os portugueses com seus barcos enormes (poderia dizer quanto maior o barco maior é o homem, mas prefiro dizer que quanto maior é o barco mais branco é o homem) adentraram numa cultura até então desconhecida, a monocultura dos afetos - termo que ouvi de Geni Núñez - precisou ser dizimada para a expansão do capitalismo, junto com eles a introdução do olhar pornografico (SEGATO,2021), no livro da biblia aquele que constrange Adão e Eva os sensualizando é reconhecido como satanás, aqui chamamos de processo civilizacional. Somado a isso temos um colonizador frustrado por não ter chegado na Índia e todo ódio projetado encontra nos indivíduos vistos como subalternos destino de alívio. A agressividade ganha contorno naquilo que não pode ser simbolizado, um ato que pretende dar sentido para aquilo que não encontra palavra. “O encontro inicial do colonizador com o colonizado seria um marco inicial que colocaria o indivíduo em uma dualidade, identificando-se ora como agressor (colonizador), ora como vítima (colonizado)”. (EMILIANO, 2021)

Então, nesse encontro temos posições distintas que irão se estruturando ao longo do tempo, colonizador e colonizado, ambos existentes na psicologia social e individual. Os frutos germinados da ambivalência instituída do encontro dessas duas raças é complexificado com a objetificação dos corpos pretos, a escravização e a mantença desses corpos nesses lugares de assujeitamento que desembocam na fertilização da terra para a entrada do nazismo.


A partir daqui irei me ater em específico em como o racismo estrutural acompanha a lógica neonazi, entretanto, ressalto a importância substancial da análise que as transformações das comunidades originárias ao longo do tempo possuem dentro desse debate,a escolha em me orientar por essa perspectiva é puramente por uma questão de atravessamento pessoal e desenvolvimento de pesquisa.


Um dos mitos mais incompreensíveis do atual cenário brasileiro é a negação do racismo estrutural e da repulsa do seu reconhecimento, entretanto, mais incompreensível seria se

não fosse assim dado o que já foi apresentado. Estando colonizador e colonizado lutando dentro de um indivíduo toda essa reação (e por que não repetição) parece encontrar um caminho muito pouco explorado, o da miscigenação enquanto conceito que representa a instância psíquica do brasileiro, e aqui não aplico o jargão “todos temos sangue de negro”, essa afirmação é um reducionismo perigoso do problema branco (afinal, o racismo seria um problema de quem se não da branquitude, mas suas consequencias, sim, são sentidas pela população negra).

Explicarei de maneira prática e resumida, porém, talvez um pouco segmentada): Dentro da história do país tínhamos senhores e escravos. Quem cuidava das crianças dos senhores? As amas de leite, mulheres escravizadas, portanto, quem nutria de afeto e proporcionava a segurança para o desenvolvimento dos indivíduos brancos eram mulheres pretas, agora a pergunta que denota a ambivalência das relações raciais. Com quem essas crianças tinham seu édipo? Mulheres pretas. Mulheres essas que depois tinham que ser preteridas, seus corpos sexualizados, mas despossuídos de afeto. De acordo com Badinter, Áries e outros autores essas mesmas mulheres pretas são “afastadas” desse cuidado devido ao discurso médico e moral da época, onde diziam que a simples convivência degradaria o processo de desenvolvimento dos indivíduos brancos, o fator que denota isso era que a partir de determinada idade as crianças falavam como as pessoas escravizadas, essa instância tão significativa que é dar sentido ao mundo através da linguagem passava pela orientação de pessoas pretas.

Dá-se uma retroalimentação entre o signo racial e o signo feminino da mãe. Portanto, longe de dizer que a criação do indivíduo branco pela mãe negra resulta em uma plurirracialidade harmônica, ou que se trata de convivência inter-racial íntima, como fazem os que tentam romantizar esse encontro inicial, o que afirmo é, ao contrário, que o racismo e a misoginia, no Brasil, estão entrelaçados em um gesto psíquico único. (SEGATO, 2021)

Seguindo o fluxo histórico desembocamos no que podemos entender como o processo eugênico do Brasil que se encontra atrelado radicalmente com a ideia de colonizador/colonizado, no final do século XIX e com o fim da escravidão algo desponta no horizonte, a ideia de como contruir uma nação brasileira, ideia essa que por consequencia giravam ao redor da questão racial, pois, como constuir a identidade de um povo se ele esta totalmente atravessado por ex-escravizados vindos de Africa e indigenas quando esses são considerados inferiores? Ora, a eugenia entra como a solução dessa pergunta propondo uma limpeza étnica, apoiados por uma ciência que criminaliza pessoas pretas - uma jurisprudência influenciada por Lombroso - e pelas políticas públicas, temos um decreto de lei (528/1890) que influenciava a liberação e o incentivos de pessoas advinda de outros países exceto indígenas da Ásia e da África. Esse processo tinha como pretensão modificar a mão de obra negra e “higienizar” a população. Foram mais de 4 milhões de imigrantes em menos de 35 anos, dez vezes menos tempo que o necessário para trazer mais ou menos a mesma quantidade de seres humanos no tráfico Atlântico. Não ressaltei as concessões legais dada aos imigrantes, as terras cedidas, o fato desta poder ser considerada uma das primeiras políticas públicas da república e a mais duradoura, meu objetivo aqui é explicitar o quão entranhado o pensamento eugenista está na nossa construção socio-histórica e por que não, subjetiva!

Novamente transito pela infância para poder relacionar o que foi dito de maneira prática. Existiu um homem no Brasil muito famoso e reconhecido que até hoje é lembrado, falo de Monteiro Lobato, homem que escrevia literatura infantil (mas não só) e que tinha grande influência eugênica no país, a ponto de escrever livros com questões raciais que defendia a esterilização de pessoas pretas, sua literatura era tão problemática que o livro teve sua chance de ser publicado nos Estados Unidos no auge da segregação, mas foi barrado pois acharam que era muito ofensivo para as pessoas negras. Atento os leitores para a construção narrativa que se fazia nacionalmente e as engrenagens psíquicas que giravam em decorrência disso, até muito recentemente os desenhos e similares das obras desse autor eram vendidas para as nossas crianças (e ainda são), pois vê-se que o ensino/aprendizagem sobre relações raciais acontecem desde a mais tenra infância e é um dos meios mais fáceis de se disseminar essa estrutura limitante. Como as crianças são entendidas como inocentes, boas, que não compreendem o que veem e ao mesmo tempo são como esponjas que absorvem tudo, o seu processo é facilmente violado (aniquiladas enquanto sujeitos e ao mesmo tempo assujeitadas em seu crescimento). Esse recurso de disseminar ideias racistas nesssa faixa de idade também foi um recurso muito utilizado na Alemanha nazista - e em muitos regimes ditatoriais.

Para elucidar que esse processo nunca foi às escondidas, temos em 1929 o Congresso Brasileiro de Eugenia, no Rio de janeiro, que discutiu especificamente a importação de mão de obra branca para lavar a “mancha” do Brasil.

Nesse emaranhado histórico é visível entender a predisposição do povo a ideias nazifascistas, essas últimas têm um seu germe a ascensão de um povo sobre o outro, o flerte de uma raça superior e da glória prometida àqueles que ascendem sob o corpo de grupos massacrados.

O retrato desse segmento no nosso país para além das células nazistas aqui existentes durante a segunda guerra se manifesta sobre o corpo dos integralistas, grupo ultra-nacionalista que tinha como lema “Deus, patria e familia”, buscavam romper as tradições da velha politicas com discursos autoritarios e com uma grande radicalização através da religião cristã. Aos colegas leitores, qualquer semelhança com o bolsonarismo não é mera semelhança. No documentário Anauê podemos perceber o trecho de um filme feito na época dotado da ideologia que parece ter ganhado vida no dia 08 de janeiro, se toda repetição se pleiteia como a tentativa de cura de um sujeito, podemos entender que essa repetição urge a atenção nesse corpo social atual - que parece o mesmo de antes - que ainda não solucionou suas entraves. Deixo aqui um trecho que resume bem a ideia que tentei apresentar:


O senhor do escravo, vitorioso, seria representado como a vida, ao passo que o escravo, derrotado, seria representado apenas como um objeto de uso e gozo do seu senhor. O escravo seria, então, apenas a ponte entre o senhor e o seu objeto de gozo, do qual apenas ele deteria o conhecimento, e o senhor do escravo só teria essa posição dada a existência do próprio escravo, tornando-se uma cruel relação de interdependência. (EMILIANO, 2021)

Pensar uma psicologia das massas no brasil e fechar os olhos para a ferida colonial aberta e nunca sarada é cair num erro interpretativo cruel, pois no centro da psique grupal brigam pela vaga de mandante, senhor e escravo, colonizado e colonizador, e agenciam ambos

para si lugares de articulação que se manifestam através de sintomas muito peculiares para nossa realidade. Outro ponto que me fez escrever essa sessão específica para o processo colonizador é exatamente a compreensão de uma identidade nacional pautada por divergências, as citações que farei quando falar sobre a propaganda neofacista em Adorno sob a ótica Freudiana importadas de Europa sem a devida contextualização é vilipendiar mais uma vez identidades que buscam-se em conjunto. Uma vez que a visão distorcida que os indivíduos tenham sobre a colonização influencia diretamente na interpretação do seu passado, na sua postura para o presente e nas suas elaborações futuras. (EMILIANO, 2021)


Apogeu da primavera em declínio


Segundo Ariès (1981), até o final do séc. XVIII a adolescência era entendida como um prolongamento da infância, sem que existisse uma separação desse processo do desenvolvimento, essa separação de infância e adolescência/juventude se firma no séc. XX. As adolescências/juventudes sempre são colocadas em lugares de esperança depois de grandes desastres, guerras e outros eventos calamitosos, isso denota a potência reconhecida dessa faixa etária, mas ela também é percebida com muita fragilidade e preconceito chegando a ser chamada popularmente de “aborrescencia”, os achados dessa fase denotam atenção por parte - segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - do Estado, da sociedade e dos seus responsáveis. Ao reposicionar estrategicamente os integrantes dos cuidados dessa população o ECA busca a tomada de consciência por parte de todo território nacional diante dos sofrimentos dessa categoria e também representa que sem investimento de políticas públicas voltadas para essa população as vulnerabilidades podem se complexificar devido ao processo peculiar de desenvolvimento biopsicosocioespiritual, sobretudo, se pensarmos como se engendram as relações sociais atuais, inviabilizando espaços de convivência comunitária, falta de orientação por parte dos pais, pais sobrecarregados e diversos outras entraves que falaremos, acabamos por posicioná-los não enquanto sujeitos para o mundo, mas como assujeitados diante do precipício e como o filósofo já bem disse se você olha muito para o abismo o abismo também olha para você.

Antes de tudo é necessário que se compreenda o papel social do adolescente, não sendo um adulto completo e não sendo uma criança, se encontra no meio termo, num certo limbo onde sua experimentação do mundo torna-se mais sensível. Diversas engrenagens estão se movendo, neurologicamente diversos processos interessantes estão acontecendo e inclusive o cérebro sobre mudanças significativas, mas orientado pela psicanálise como sou deixarei o cérebro anatômico na mesa e buscarei uma ideia de sujeito que busca se encontrar num país de tantas possibilidade e nenhuma ao mesmo tempo.

A adolescência apresenta-se como um período de transformação, de conexões e necessidades transicionais que os vulnerabilizam ( o encontro com a sexualidade/ com a necessidade de pertencimento/ construção da identidade), em suma uma fase vivenciada com angústia. Dos (des)encontros sexuais talvez possamos traçar um panorama que entrelaça os atravessamentos citados, pois temos através dos primeiros ensaios de relação amorosa um encontro com a experimentação do corpo, dos jogos de prazer vivenciados por seus pares ou não, temos a possibilidade da busca ativa dos interesses que acabam por delimitar gostos e preferências, não que já não existissem, mas dessa experiência testam-se até mesmo coisas já sabidas, começa-se, portanto, os sofrimentos advindos dos lugares que ocupam, seu lugar-filho, seu lugar-amigo, seu lugar-corpo adultizado, e outros

diversos. Esses espaços ao mesmo tempo que possibilitam caminhos, por diversas vezes, são limitados e até impossíveis de acesso, por exemplo, a angústia de um menino ao se descobrir com uma orientação sexual distinta da norma, ao vivenciar essa experiência subjetiva ensaia-se o desmoronamento dos lugares ideais (ideais dos pais, da sociedade, dele próprio, etc), é necessário a observação se os grupos que o acolhiam ainda irão o acolher - a descoberta do corpo enquanto político para muitos - e o que se fará de si a partir daquele momento.

Durante esse ínterim as figuras parentais ganham um contorno de sustentação significativo na vida dos adolescentes, seja por que são figuras de autoridade e de cuidado, seja por que são modelos admirados, o que se dá dentro dessa relação que as vezes impossibilita o olhar atento dos pais para esse processo peculiar, muitos pais acabam por relegar a esses sujeitos o cuidado de si próprios por uma estrutura social que obriga uma adultização precoce, ou um abandono dos mesmos por não conseguir encontrar na figura do filho a imagem antes ficcionadas e agora só encontram alguém que sentem como disruptivo, esquivo e até agressivo muito das vezes, a verdade é que nesse momento crucial esses indivíduos encarregados de novas obrigações e desautorizados de outras pela pouca idade é que irão necessitar que essas figuras se apresentem como um suporte para o atravessamento dessa turbulência. É preciso ressaltar nessa altura que faço uma leitura um pouco generalizante desse processo da adolescência, como dito no início do texto, o que nos impulsiona aqui é uma dada adolescência inscrita sob um viés desestruturante que o aproxima de grupos autoritários.

Dito isto, entendemos que a presença dos pais é fundamental, na realidade ela se mostra como um fator decisivo quando pensamos sobre os massacres realizados nos últimos anos, não imputo a culpa aos pais, seria hipócrita e acrítico, sobretudo seria a repetição de um erro cometido há muito por uma certa psicologia e uma certa psicanálise, o que explicito é diferente, falo sobre uma relação profunda de cuidado que se estende para o mundo e pode auxiliar os meninos (na maioria dos massacres são meninos que o fazem) para a escolha, principalmente a escolha em deixar os pais ou não.


Não há escolha que prescinda de indicativos, direções, determinantes que lhe são anteriores. O sujeito os recebe ao longo de sua infância, dos pais, educadores, colegas, meios de comunicação, enfim, do mundo a sua volta, através do que lhe é transmitido pela linguagem falada, escrita, visual, comunicativa ou ainda pelo silêncio. E pode continuar recebendo esses mesmos indicativos, direções e determinantes, ao longo de todo processo adolescente. (ALBERTI, 2010)

Portanto, - como já sinalizou o ECA - Estado, sociedade e os pais são responsáveis pelas adolescências, tanto aquelas que passam despercebidas (e esse pode ser um dos problemas) quanto aquelas que mas/sacram ( ou seria, mas/sacro, o ato que interrompe o sagrado da vida?).

A necessidade da sustentação munida da desistência dessas entidades podem ser sentidas de maneira assustadora, desesperado e perdido, o adolescente então inicia uma busca que pode ser uma completa catástrofe na tentativa de alcançar novamente a mão dos pais o que, como numa bola de neve, tem cada vez mais dificuldade de conseguir. O sujeito pode escolher ou não atravessar a adolescência, muito se sabe que dentro das masculinidades

temos homens que agem como eternos adolescentes, claro que a estrutura social possibilita essa desresponsabilização do homem, mas a adolescência como escolha do sujeito implica pagar o preço do desligamento dos pais, assumir que só é possível contar com o Outro em nível simbólico. Não é possível pensar a adolescência sem referência à castração, porque o trabalho que a representa é o da tentativa de elaborar a castração, o que cada sujeito estruturado conforme a neurose fará de seu jeito. (ALBERTI, 2010)

A desistência desses indivíduos não só pelos pais como também por outras instâncias a busca por um modelo que dê conta da sustentação de suas angústias, é por essa via que o medo da castração e sua repulsa em entrar em contato com a falta constituinte orienta uma busca dentro de grupos autoritários, procura-se um ideal necessário que sustenta ou busca sustentar essa insegurança. É na aceitação da castração que o desejo se alimenta.

Portanto, a inserção do adolescente no grupo figura uma tentativa de elaboração da angústia ( tanto dos grupos sadios/ quanto dos grupos autoritários) e incremento das identificações dos ideais/características dos mesmos como uma forma de velar a angustiante questão de que falta um significante no Outro. Ou dito de outra forma, de que existe um ponto cego, algo que não se acessa (no outro e no mundo).


Em seu escamoteamento, o adolescente já não sabe mais avaliar a importância que têm seus pais (ou substitutos) para ele como alicerces. Seu assassinato pode se seguir então, num momento em que um afeto, uma emoção prevalece sobre o alicerce que ele aprendeu a desvalorizar com o uso de drogas, com sua identificação com o discurso de “amigos”, além do próprio discurso capitalista, aquele que foraclui a perda, escamoteia a angústia de castração e muitas vezes impede os próprios pais de perceberem que algo não vai bem no diálogo com seus filhos. (ALBERTI, 2010)

O discurso capitalista pode ser significado nesse debate como um dos centros do problema, embebido pela lógica neoliberal o Brasil enfrenta um debate acirrado quanto às liberdades dentro das redes sociais, o que se sabe é que nós, defensores dos direitos às crianças e dos adolescente, vemos como premente a necessidade de medidas de segurança dentro das redes para todos os adolescentes na internet, temos indícios precisos de que muito desses jovens são cooptados pelas redes sociais a participar de fóruns privados onde existe muita dificuldade de rastreio, essa cooptação acontece através da seleção de jovens em vídeos que se elogiam figuras cruéis, ditadores sangrentos, autores de massacres em escolas e por aí vai. É crucial dizer que esses vídeos estão disponíveis não em partes obscuras e criminosas das redes, mas visíveis a todos e a quem queira em redes abertas que sem monitoramento continuam a propagar ódio e disseminar sementes da “exterminação”. Observa-se que esses sujeitos que cooptam jovens encontram-se em grande medida ligados a células nazifascistas e um importante dado é que atualmente eles têm entrado em fóruns específicos de jogos para fazer a seleção dos adolescentes, pior, estão começando a utilizar os símbolos característicos de games e outros grupos (como motoqueiros) numa tentativa de se mesclar - passar despercebido - diante dos olhares curiosos. Segundo uma reportagem do g1 muitas das contas que exaltam responsáveis por massacres cultuam solidão e sofrimento, declarando “ódio ao mundo”, esses sentimentos vindo de adolescentes passariam despercebidos uma vez que podem possuir

comportamentos de enclausuramento e distanciamento social (o que já deve gerar atenção).

Esse fácil acesso dentro da internet a conteúdos obscenos/degradantes/criminosos não pode ser criticado pela via única da responsabilização da parentalidade sem o olhar atento para as necessidades sociais presentes. Numa família onde temos uma mãe que gere uma família com 3 crianças/adolescentes e uma avó já velha e tem a necessidade de trabalhar em dois empregos e cuidar da casa para garantir a sobrevivência de todos, tem na tecnologia, muito das vezes, não o inimigo que falamos aqui, mas relegam uma pedagogia àquilo que os auxiliam. O que digo é que existe uma estrutura social que inviabiliza o pleno cuidado dessa população, e essa possibilidade de manuseio se dificulta com o acesso à educação, ao lazer, à cultura, aos serviços de saúde e tudo o que se entrelaça no que podemos chamar de saúde mental.

O capitalismo no neoliberalismo também inviabiliza o sentimento comunitário, sua lógica de condomínio ergue grades e uma sensação de insegurança entre os pares, os afetos positivos são deglutidos com dificuldades, os negativos ganham nessa estrutura um respaldo consternante. A própria adolescência é coisificada nesse sistema, objetificados e totalmente sedentos por pertencimento tornam-se alvos do mercado.



Altamente democratizante, por realmente permitir a qualquer um propor o que quer que seja, o discurso capitalista não dá nenhuma direção, não promove qualquer laço social, e tampouco leva em conta a castração. Tudo deve ser sempre passível de recuperação, nada pode ser perdido mas tudo deve ser sempre reaproveitado, e ninguém aí assume uma posição de mestria frente ao adolescente. Ele próprio, aliás, não é visto como um sujeito por esse discurso, mas como posição de gozo a aproveitar, comprar e promover mais gozo a partir dos gadgets fabricados. Então se investe em roupas, músicas, restaurantes, revistas, bares, sites para adolescentes… (ALBERTI, 2010)


Adolescentes que sofrem bullying também são vulneráveis para esses grupos de extremistas. Machucados pelas experiências encontram no discurso da violência uma oportunidade de externalizar seus sentimentos adormecidos, para além disso, é oferecida uma solução prática e que em contrapartida o tornará querido para aqueles que o incentivam, já dizia o educador “O sonho do oprimido é ser opressor”.


Levanto de maneira breve (mas nesse espaço convoco os amigos educadores a se manifestarem de uma forma mais precisa) o formato das escolas como uma via que impossibilita e ao mesmo tempo potencializa as violências, Foucault falou enormemente sobre isso, sua estrutura, o controle dos corpos, uma organização de pessoas que inviabiliza e tenta controlar os afetos (e onde são largamente trabalhados, sobretudo, na lógicas citadas). Uma das estruturas que a escola pode fornecer ao adolescente (e seria essa a mais replicadas desde a invenção da mesma) é uma lei da pura interdição que justamente não sustenta o sujeito enquanto desejante mas tiraniza-o, exigindo que trabalhe deixando seu próprio desejo para um depois.

Por último, dentro dessa seção, falaremos da importância do modelo enquanto aquilo que possibilita a orientação do desejo, falarei de um assunto caro para Lacan, mas de maneira breve e da melhor forma possível.

Sabendo que a estrutura da adolescência se inscreve sobre o ensaio da travessia da castração (sustentar um vazio, uma impotência) o nome-do-pai (ou melhor, a função paterna) aparece enquanto uma instância organizadora do núcleo familiar. Se o Nome-do-Pai tem por função sustentar o sujeito enquanto desejante, o adolescente neurótico para o qual falha seu sustento se acovarda, antes de mais nada, frente ao próprio desejo, isso quer dizer que os indivíduos que buscam esses grupos estão atrás de um “algo” que dê conta de ordenar simbolicamente a sua forma de desejar, demonstrando-o como deve ser regulado, claro que todo o sujeito é participante desta feição, toda sua história compreende o contorno do seu desejo. Em suma podemos dizer que a busca pelo nome do pai seria a busca por uma estrutura organizadora, que coloca sentido e que faz desejar, mas falaremos melhor sobre isso adiante, tanto desse pai quanto do pai físico (mas ausente.


Mito viril


Em números absolutos, 160.407 recém-nascidos foram registrados apenas com o nome da mãe em sua certidão de nascimento em 2020. Em 2021, foram 167.399 mil. Os índices chamam atenção por manter o patamar dos anos anteriores, apesar de serem verificados nos anos com o menor índice de nascimentos desde o início da série histórica dos cartórios, em 2003: 2.644.562 registros em 2020 e 2.642.261 em 2021. [...]

De acordo com o levantamento, os reconhecimentos de paternidade caíram 32% entre 2019 e 2020. Foram realizados

35.243 atos no ano anterior à pandemia. No ano seguinte, esse índice caiu para 23.921. Já em 2021, foram 24.682. As informações foram coletadas nos 7.654 Cartórios de Registro Civil do Brasil. (Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2022)


Começo essa parte com essa citação para denotar a falta física/real das figuras paternas no Brasil, isso denota tanto uma instabilidade na figura masculina que se pretende “pai de família" (amplamente divulgada) quanto um problema social que urge a conscientização e exploração por meio das ciências para a possibilidade de efetivar responsabilidades de uma classe que se utiliza da passabilidade que tem para exercer a negligência. Essa masculinidade - que denomino como masculinidade do mito viril - nas últimas manifestações favoráveis ao golpe militar e a permanência do antigo presidente permitiu-nos o acesso a uma cena onde mulheres e crianças foram usadas como escudo, não ironicamente o grupo se monta sobre a égide da “Deus, pátria e família", lema fascista do integralismo que carrega sobre si a manutenção de lugares que não deveriam ter se mexido ao longo do tempo, mas se mexeram e o que atesta a sua impotência, a impotência viril, é exatamente as cenas citadas.

Dentro desse escopo onde parte dos homens são irresponsáveis e negam sua posição paterna - isso também é muito significativo, pois querem continuar o gozo sem a responsabilidade, sem os esteios do limite - e a outra propõe que corpos de mulheres e

crianças sejam usadas como barreira entre eles e a lei (pai imaginário) acabam pondo as adolescências em rumos precários de identificação.

Longe de ser um pai físico aquele que irá salvar os adolescentes, mas para esses adolescentes capturados pela lógica neofacista a negação da castração é uma tábua salvadora no naufrágio do seu corpo-mundo e os grupos de homens com lógicas autoritárias - como os red pill (existe texto sobre o movimento no blog) - se apresentam para estes como aquilo que dará sustentação para sua sensação (e eventual) queda. Alberti irá dizer que se o sujeito, tem a necessidade de um pai, esse é de uma outra ordem que o da realidade — a quem também chamamos de pai imaginário, o grupo cumpre então uma função, o de dar sentido para as vivências da adolescências, orientam o que fazer consigo e como fazer e como sentir (orientam o desejo).

Certo é que esse modelo de homem está atrelado ao que Freud em totem e tabu desvenda, aquele que busca pelo pai que goza livremente, sem interdições, sanções, sem a civilização dando estrutura que limite o seu passe livre, a abominação desses homens pela frase “meus direitos terminam quando os seus começam” é nítida, Ambra dirá que decerto o homem viril - assim como a própria definição de homem cidadão ou virtuoso - parece ter sido sempre construído entre uma positividade e uma negatividade (desvalorização das mulheres) denotando o que levanto aqui.

Esse modelo masculino é extremamente perigoso, pois romantiza o herói, figura de poder e admiração tão requeridas pela juventude, portanto, o prêmio buscado pelos assassinos é ser lembrado como o herói dos renegados, conquistando fama e respeito entre seus iguais. Mais ou menos como os homens-bombas que não se importam com a própria morte, porque serão premiados na eternidade, principalmente, quando pautamos o modelo nazifascista vemos esse apelo pela figura de autoridade heroica muito presente, é o pai que irá corrigir com punhos de ferro os transgressores, e se humano demais, atrelá-lo a uma religião e que dela viria sua força o torna ainda mais imbatível. (MANSO, 2023)


A emergência e recorrência na história da masculinidade, dessa projeção de selvageria é, assim, um ingrediente essencial da própria civilização, pois se a civilização teve um marco 0, um início, significa que em algum momento houve um estado de absoluta selvageria (gozo), houveram homens incontroláveis, não à toa vemos que nos sec. XVI - XVII um dos exercícios de autocontrole e repressão sobre o corpo era e distinção entre quem acessava as armas e as letras no qual os homens bélicos distanciavam-se da nobreza, mas não podemos dizer especificamente que o apreço por armas de atualmente tenha esse contexto histórico, ele se aproxima muito por aquilo que Freud já pontuou, um objeto fálico com o intuito de conferir potência a quem sabe-se sem ela, o representante da falta, e essa virilidade que coopta jovens consegue disseminar esse apreço por esse significante dos homens potentes e só potentes que não vislumbraram qualquer artifício controlando todo o seu desejo, mas o que Ambra nos diz é que esse homem - e todos os outros - são uma representação de um lugar a ser ocupado. O homem, o macho, o viril tal como o conhecemos é uma criação de discurso - nada, pelo menos, do que se analise, pode ser definido de outra maneira.


Se é discurso precisamos falar sobre o que se diz deles e o que eles dizem de si, é necessário colocar em "análise" as masculinidades para se compor estratégias de reorientação desses jovens que se entregam a essa narrativa com o intuito de se salvarem. É preciso ação do Estado, da sociedade e das parentalidades brasileiras nessa busca por alternativas, muito delas já conhecidas, por último, busca por luta discursiva para pleitear

vaga nas subjetividades que podem ser cooptadas para a destruição e fazer fluir vida e como diz o livro da bíblia “vida em abundância".


Estrutura da propaganda fascista segundo Adorno


Antes de começar esse texto devo fazer uma observação importante, todas as citações serão retiradas do que Adorno escreveu: teoria freudiana e o padrão de propaganda fascista. Apesar de não caber totalmente na realidade brasileira esse texto pode servir como bússola que nos orienta diante do que o bolsonarismo apresentou. Curiosamente, apesar da propaganda nazifacista utilizar meios tecnologicos modernos para propagar seus ideais, sua estrutura continua muito parecida com o que Adorno já sinalizou, talvez por ser ela mesmo uma organização extremista pautada num conservadorismo um tanto quanto hipócrita, portanto, não irei ficar citando as fontes, ela será única, caso recorra a outros autores serão devidamente nomeados.


O primeiro fato que Adorno aponta é o do líder da propaganda, aquele que mostra seu rosto e “veste a camisa” para ter em si introjetado toda a organização fascistizante, longe de ter um projeto político conciso esses líderes são agitadores da ordem, a destrutividade é o fundamento psicológico sobre o qual se baseiam as propagandas, “os programas são abstratos e vagos, as satisfações são espúrias e ilusórias, porque a promessa expressa pela oratória fascista nada mais é do que a própria destruição.” Podemos perceber esse apelo pelo caótico através da tentativa de abolição da democracia através do apoio das massas cooptadas pelos discursos.


Indo de acordo com o que ressaltei acima podemos entender que as massas (principalmente as movidas pelo fascismo) recorrem a mecanismos psicológicos arcaicos e pensando que os apoiadores do último governo são homens -existem pesquisas feita por jornais antes das eleições que demonstram isso - esse mecanismo ganha eco nas necessidades da construção masculina viril, “o indivíduo entra no grupo sob condições que lhe permitem anular os recalques de suas moções pulsionais inconscientes", isso é o mesmo que dizer que o grupo permite que coisas antes escondidas da consciência pudessem subir à superfície e ser exposta livremente. Concatenando com o que já expus, Adorno irá salientar que “como uma rebelião contra a civilização, o fascismo não é simplesmente a recorrência do arcaico, mas sua reprodução na e pela civilização.”


Os grupos são mantidos através de uma corrente libidinal (energia psicosexual) que unifica o grupo, mas sob um véu se escondem a verdadeira ligação amorosa dos membros. Essa energia libidinal que é primária necessita se manter em um nível inconsciente para facilitar a manipulação dos membros nos fins políticos almejados “Quanto menos uma ideia objetiva, tal como a salvação religiosa, desempenha um papel na formação das massas, e quanto mais, a manipulação das massas se torna o único fim, tanto mais o amor completamente inibido precisa ser recalcado e transformado em obediência. Há muito pouco no conteúdo da ideologia fascista que poderia ser amado.” Refletindo sobre essa citação podemos nos lembrar na adoração santificada da figura do “messias” Bolsonaro, tendo igrejas lotadas por seus cartazes e chegando a subir num púlpito de uma igreja famosa e ser profetizado que ele era o escolhido.

Outro ponto concordante com minha observações anteriores é a necessidade de encontrar a lei (“o pai”) na figura do líder, um figura e organização e sustentação “o líder do grupo é ainda sempre o pai primitivo temido; o grupo sempre será dominado por uma violência ilimitada, demandando a autoridade em alto grau, tendo sede por submissão. O pai é o ideal do grupo que domina o eu em lugar do ideal do eu.”


Ou seja, a propaganda fascista tem uma veia psicológica que unifica o grupo, mas possui um cenário sociopolítico onde pode germinar fluidamente, Adorno nos alerta para algo que no Brasil é urgente, um cenário social onde a desesperança política é cultuada como estratégia para minar movimentos sociais e uma população machucada que apesar da sua racionalidade tem uma experiência de vida permeada de fracassos em satisfazer as demandas de seu próprio eu, os orientando psiquicamente as figuras de autoridade que colocarão “ordem na casa”, e quanto mais autoritário melhor. “Ao fazer do líder seu ideal, ele ama a si mesmo, por assim dizer, mas se livra das frustrações e mal-estar que desfiguram a imagem do seu próprio eu empírico.”


Como já dito em outra parte deste texto o brasileiro possui em sua gênese psíquica o que podemos chamar de "instância do colonizado/colonizador”, uma ambivalência constitucional que ganha concretude nas relações sócio-históricas e se imbricam nas relações afetivas, toda essa bagagem facilita o terreno para a chegada de um líder fascista (tanto é que houveram outros ao longo da história do Brasil), Adorno diz que essa ambivalência ajuda a operar esse tal milagre social tanto requerido pela massa e alcunhado pelo líder, a imagem do líder nesse jogo bipartido satisfaz o duplo desejo do seguidor em se submeter à autoridade e ser ele mesmo a autoridade.


O ódio e a igualdade também ganham um importante papel dentro dos grupos, papel unificador, o ódio contra uma pessoa ou uma instituição pode suscitar vínculos emocionais semelhantes ao da afetividade positiva, e não digo que os dois são o mesmo, mas falseado pela propagando facista o ódio encontra no inimigo (muito das vezes inventado) uma possibilidade de reorientar uma libido autodestrutiva dos membros entre si. Já a igualdade entre os membros se aproximam a uma fraternidade da humilhação geral, ninguém deve ser melhor do que ninguém, mas a questão hierárquica é mantida, no fundo, um jogo perverso de gratificação. Nesse ínterim podemos citar o ódio ao fantasma do comunismo, ao STF, às instituições reguladoras e por aí vai. Não digo que tais instâncias não devam ser passíveis de críticas, sobretudo o STF que precisa reestruturar a jurisprudência de forma eficaz, mas os comportamentos desses grupos se diferenciam nitidamente àqueles que tecem críticas democráticas aos órgãos mantenedores da ordem.


Por último e não menos importante é primordial destacar a capacidade do líder fascista em compreender e apreender as necessidades psicológicas do grupo social e externalizá-las, o que quero dizer é que esses líderes assim como alguns comunicadores conseguem voltar seu inconsciente para fora, fazer um uso racional da sua irracionalidade no intuito de cooptar o inconsciente que se coletiviza através da identificação, ele sabe como vender sua instabilidade e sensibilidade ao público que o assiste e é admirado por isso, no fim, o segredo da propaganda fascista é tomar os homens pelo que eles são “ verdadeiros filhos da cultura de massa padronizada, em grande parte subtraídos de sua autonomia e espontaneidade.”

Apesar do exposto e da urgência em reconhecer toda a aparelhagem nazifascista que hoje se mostra latente na sociedade é fundamental redizer o que Adorno disse “Disposições psicológicas não causam o fascismo; em vez disso o fascismo define uma área psicológica que pode ser explorada de forma bem sucedida pelas forças que promovem por razões de interesse próprio completamente não psicológicas.” É o mesmo que dizer que o cenário social é articulado por agentes que compreendem o funcionamento dos grupos e se utilizam disso para a manipulação das massas no intuito de chegarem em seus próprios objetivos. Certo é, que esse diálogo e os que virão a partir disso tem que ser colocados na “mesa do povo”, a psicologia enquanto ferramenta de sustentação do sofrimento e oferta de qualidade de vida tem um papel estruturante em um devir que possibilita outras formas de ser, longe da repetição autodestrutiva, perto das agonias daquele que emudecido grita, proporcionando senso crítico, psicoeducação, acolhimento, espaço de diálogo e principalmente transformação social!




Referências:

O adolescente e o Outro - Sonia Alberti História social da criança e do adolescente

Um amor conquistado: O mito do amor materno

O trauma colonial e os rumos da psicanálise (à) brasileira

O que é um homem: psicanálise e história da masculinidade no ocidente - Ambra Ensaios sobre psicologia social e psicanálise - Adorno










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